Mas, se algo ficou das tantas tentativas e esquecimentos, é que armadilha maior é deixar a escrita e o momento passarem. Hoje, eu, que nunca fui de estudar e tampouco pensar em escrever poesia, vi uma necessidade imperiosa da escrita vir em verso. Resolvi não dar tempo para um certo constrangimento fazer guardá-la para mim, pareceu um acontecimento forte demais para não convertê-lo nesse impulso que deixei tantas vezes para depois e finalmente fazer o que acho imprescindível: romper com essa violência da escrita puramente profissional. Hoje ela se tornou expressão. Essa respiração profunda que Bandeira tão maravilhosamente eternizou quando nos ensinou que "Quem faz um poema abre uma janela". Pego carona nesse poeta tão querido para vencer esse constrangimento e também embarcar numa espécie de luta: que compartilhemos cada vez mais para que a arte seja uma grande comunhão de janelas e não a tão corrente asfixia de egos.
O que se segue é um poema? Não sei. Talvez seja justamente por não saber que ele existe.
Eu amo tudo que sou.
Amo o que faço.
Amo minhas escolhas e a luta
que travo
– todos os dias – por elas,
por mim.
Pelo direito de ser, de
estar.
Brindo todos os dias a nossa
resiliência.
Mas há dias em que não somos
fortaleza.
Há dias em que a luta é pelo
direito à ruína.
Há dias em que apenas estamos
cansadas...
Mas há tanto silêncio que isso...
Ouvir nosso próprio cansaço,
Parece um crime.
Então, hoje, a luta se faz
por ele.
Pelo cansaço.
Pela exaustão.
Porque fortaleza é também
prisão.
De tanto ouvir que somos
fortes,
Esquecemos que essa é uma
necessidade.
Não uma obrigação.
É preciso ter voz para lutar,
Mas também para sentir.
Faço, assim, desse dia, uma
comunhão.
Para que não compartilhemos
apenas nossas garras,
Mas nossa voz.
Nossa dor.
Para que nos recordemos
Que há dias de entrega.
De recolhimento.
De saber. De lembrar.
Lembrar que há dor. Há
sangue.
E só há cura com o olhar.
Olhar que reconhece.
Olhar que aceita.
Olhar que abraça.
Abracemos então nossas
feridas.
Nosso coração que sangra. E também
cicatriza.
Deixemos que teçam a linha
que costura nosso caminho.
Para não morrer por dentro,
Para deixar fluir,
Dedico esse momento à voz.
A essa voz humana tão
massacrada.
Tão exausta das batalhas.
Há fortaleza na derrocada
E desmoronamento
Na fortaleza compulsória da
vida.
Hoje é dia de sentir, de
viver.
Desse mergulho crocitante em
si.
Que perde.
Cura.
Floresce.
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